sexta-feira, 8 de dezembro de 2006

Culinária


O insular é povo cozinheiro. Tanto os homens quanto as mulheres. Cada um tem sua especialidade e adora mostrá-la aos amigos em verdadeiros desafios culinários.


Deve ser por essa razão, caros leitores que vinte e tantos anos atrás, após encalhar na ilha do Socó e empreender idas e vindas à praia para salvar o que pudesse numa cabana que construí, fui em busca de casa de repasto, em um sábado à tarde e nada encontrei. Estava tudo fechadíssimo. Nem uma simples padaria, nem uma taverna daquelas de aguardente e cerveja, com um ovo cozido colorido da semana passada. Zero. Passei fome. Tavernas e casas de repasto fechavam cedo com certeza para que seus proprietários juntassem-se aos que estavam trancados em casa cozinhando. Naquele tempo era quase que exclusivamente a moqueca que dizem os da terra ser exclusivamente capixaba pois o resto é peixada. Feita em antiquíssimas panelas de barro e alguns apetrechos misteriosos onde se ferve o urucum, cuja finalidade é desconhecida pois que insosso.


Na minha santa inocência europeia e sabendo este reino rico em boa carne aventurei-me, de outra feita, em adentrar casas de repasto com apetite para um excelente e vasto bife com fritas. Pois, caros leitores, isso era rigorosamente desconhecido por estas plagas e ainda o é. Vinte e tantos anos atrás, as casas de repasto eram de uma simplicidade franciscana com mesas e cadeiras doadas por mercadores de cerveja. Comia-se a moqueca ou então entregavam-se os autóctones ao tal febril ritual do desmembramento e chupação de caranguejos; algo cuja simples menção me traz à mente relatos sobre o que a inquisição papista andou realizando no pobre continente europeu.


Viviam disso, os nativos: caranguejos, camarões e moquecas. Sanduíches em hipótese alguma pois nem pão de forma encontrava-se que não fosse algo estranho, produzido pela própria padaria.


Os anos foram passando e cá arribando novos náufragos que, aos poucos, conseguiram introduzir novos hábitos culinários. Conseguiram a incrível façanha de convencer os insulares que o peixe poderia ser cortado de outra maneira que não em postas, algo de dificílima compreensão já que o animal era ora fatiado latitudinalmente ora assado inteiro, o pobre infeliz, para nosso deleite. Aprenderam que o peixe tem um filé que, se preparado adequadamente, com manteiga e alcaparras induz uma mansidão das papilas gustativas incomparável.


Minha tristeza, caríssimos, ainda se resume ao bife com fritas que, como já disse, inexiste ainda. Preparam carne de todas as maneiras mas ainda não aprenderam a colocar um belo bife num prato com batatas fritas que não tenham sido congeladas antes. Também devoram-se sanduíches tremendos, vastíssimos, a deixar escorrer coisas diversas pelos lados. Muito superiores aos importados das colônias inglesas do norte que sabem a papelão com pepinos.


Os autóctones agora exibem talentos culinários diversos aos amigos em sua eterna competição. Alguns deles meteram-se até a provar de vinhos e ficam a bochechá-los de modo curiosíssimo ao passo que nós preferimos bebê-los aos goles, clamando por mais; e que encham-me a taça, por favor!


Fiquei faminto...

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