quarta-feira, 6 de dezembro de 2006

Enchendo Lingüiça


E não é que importante diário insular publicou missiva deste náufrago?

Li, com horror, a notícia da criação de uma nova secretaria de obras em nossa cidade. Tal horror não se originou pela inútil criação burocrática pois bastava criar-se uma sub-divisão da atual secretaria. Foi algo mais sutil: nos últimos anos, o burocratês oficial esqueceu-se da palavra "obra" e preferiu substituí-la pelo genérico "intervenção": passaram a ser comuns expressões nauseantes tais como "intervenção semafórica" ao invés de troca ou colocação de placas ou sinais. Li a notícia lentamente, aterrado pela possibilidade da utilização do medonho neologismo. Foi então com alívio que, ao final da leitura, constatei que alguma sensatez prevaleceu e que uma possível e intolerável "Secretaria de Intervenções" não nasceu, mas duvido que tal nome não tenha sido secretamente aventado...

Pois é, caros leitores. Em dias de pouca inspiração, tira-se água de pedras.

Antropofagia bípede


Caros herdeiros. Antes de cá naufragar naveguei por esse mundo afora e testemunhei das coisas mais exóticas, dos mais variados costumes. Vi as mulheres girafas e os faquires; os mandarins e suas tranças e as chinesas com pés minúsculos; vi os pigmeus de África e os gigantes da Terra do Fogo. Também vi na Mandchúria chineses comer cérebros de macacos vivos, até morrerem; comerem serpentes, cães, escorpiões e até gente, em Nova Guiné! Por um triz escapei de ser devorado pelos antropófagos de lá.


Felizmente estas terras não abrigam amantes da antropofagia embora autócnones me tenham assegurado de sua existência séculos atrás, entre os primitivos ocupantes destas plagas.


Cá as pessoas normalmente compram ou pescam seu alimento. Cada vez mais compram já que o mar anda escasseando o bom peixe e os mangues estejam ficando procupantemente desabitados de caranguejos. Aliás, não compartilho do hábito local em deglutir esses polípodos de deslocamento lateral e intermitente que chafurdam no lodo pois me lembra os festins de antropofagia que testemunhei nos antípodas: os pobres crustáceos são fervidos vivos e depois disso esquartejados e destruídos a golpes de pequena borduna. Chupam-se-lhes as poãs e bebem-se-lhes um caldo que esgota das entranhas. Além disso, seu odor lembra o de certas algumas namoradas que tive, pelos portos do mundo.


Nada porém supera o frango antropófago que descobri em grande mercador de comida daqui. Acredito ser ele um frango conhecido e célebre por seu canibalismo pois até pouco tempo atrás sua imagem era estampada nas embalagens de frango assado que o tal lugar vendia. Está ele lá, com garfo e faca, pronto para devorar, com muito gosto, um de seus semelhantes.


Felizmente guardei uma dessas imagens ou ninguém, nem na Capadócia acreditaria em mim!


Censurei o nome do tal mercador pois não estou aqui para fazer propaganda de ninguém!